terça-feira, 28 de agosto de 2012

As mesmas!

Quando ela aguardava ao lado da moto eu tentei alertá-la que velava um objeto. Busquei mostrar-lhe o ridículo do seu ato. Queria puxar-lhe dali e apontar as tantas outras coisas que estavam no mesmo espaço.

Agora eu estou velando uma página. O que nos diferencia? Qual a sensatez que eu tenho e ela não? Que direito eu tinha de julgar ridícula a sua atitude, se agora os meus olhos estão parados esperando, em cada segundo, a resposta que ninguém quer dar?

Tola eu, tola ela!!!


Completando!

Sou daquelas que quando a coisa está ruim lê Florbela Espanca só para piorar rs:

Hora que passa

Vejo-me triste, abandonada e só
Bem como um cão sem dono e que o procura,
Mais pobre e desprezada do que Job
A caminhar na via da amargura!

Judeu errante que a ninguém faz dó!
Minh'alma triste, dolorida e escura,
Min'alma sem amor é cinza e pó,
Vaga roubada ao Mar da Desventura!

Que tragédia tão funda no meu peito!...
Quanta ilusão morrendo que esvoaça!
Quanto sonho a nascer e já desfeito!

Deus! Como é triste a hora quando morre...
O instante que foge, voa, e passa...
Fiozinho d'água triste...a vida corre...

Florbela Espanca

Agosto!

Vergonha em dose máxima.
A leitura sem respostas.
A mulher burra que eu tanto critico.
Agora sou eu.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Drummond sabe das coisas, eu não!

Não se mate

Carlos, sossegue, o amor
é isso que você está vendo:
hoje beija, amanhã não beija,
depois de amanhã é domingo
e segunda-feira ninguém sabe
o que será.
Inútil você resistir
ou mesmo suicidar-se.
Não se mate, oh não se mate,
Reserve-se todo para
as bodas que ninguém sabe
quando virão,
se é que virão.
O amor, Carlos, você telúrico,
a noite passou em você,
e os recalques se sublimando,
lá dentro um barulho inefável,
rezas,
vitrolas,
santos que se persignam,
anúncios do melhor sabão,
barulho que ninguém sabe
de quê, praquê.
Entretanto você caminha
melancólico e vertical.
Você é a palmeira, você é o grito
que ninguém ouviu no teatro
e as luzes todas se apagam.
O amor no escuro, não, no claro,
é sempre triste, meu filho, Carlos,
mas não diga nada a ninguém,
ninguém sabe nem saberá.

Carlos Drummond de Andrade
(1902-1987)

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Eu também queria ter escrito esse texto!

Meditação do Duque de Gandia sobre a morte de Isabel de Portugal

Nunca mais
A tua face será pura, limpa e viva
Nem o teu andar como onda fugitiva
Se poderá nos passos do tempo tecer.
E nunca mais darei ao tempo a minha vida.

Nunca mais servirei Senhor que possa morrer.
A luz da tarde mostra-me os destroços
Do teu ser. Em breve a podridão
Beberá os teus olhos e os teus ossos
Tomando a tua mão na sua mão.

Nunca mais amarei quem possa viver
Sempre.
Porque eu amei como se fossem eternos
A glória, a luz e o brilho do teu ser,
Amei-te em verdade e transparência
E nem sequer me resta a tua ausência,
És um rosto de nojo e negação
E eu fecho os olhos para não te ver.

Nunca mais servirei Senhor que possa morrer.

Aquele que partiu
Precedendo os próprios passos como um jovem morto
Deixou-nos a esperança.

Ele não ficou para conosco
Destruir com amargas mãos seu próprio rosto.
Intacta é a sua ausência
Como a estátua de um deus
Pouapada pelos invasores de uma cidade em ruínas.
Ele não ficou para assistir
 morte da verdade e à vitória do tempo.

Que ao longe,
Na mais longínqua praia,
Onde só haja espuma, sal e vento,
Ele se perca, tendo-se cumprido
Segundo a lei do seu próprio pensamento.

E que ninguém repita o seu nome proibido.

Sophia de Mello Breyner
(1919-2004)

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Trecho!

(...)

Quantas vezes, Amor, me tens ferido?
Quantas vezes, Razão, me tens curado?
Quão fácil de um estado a outro estado
O mortal sem querer é conduzido!

(...)

Manuel Maria Barbosa du Bocage
(1765-1805)

Compartilhamento!

Quero falar de ti. Lembra-te daquela tarde em que nos encontramos nas escadas da faculdade? Mal nos conhecíamos, tu me cumprimentaste com timidez, eu te sorri um pouco desajeitada e cada qual continuou o seu caminho. Tu naturalmente me esqueceste no instante seguinte, mas eu continuei pensando em ti e não sei por que fiquei com a certeza de que ainda haverias de ter uma grande, uma imensa importância na minha vida. São pressentimentos misteriosos que ninguém sabe explicar.

(Carta de Olívia para Eugênio no bonito livro "Olhai os Lírios do Campo" de Érico Veríssimo)

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Perder!

Eu disse que dançaria. E dancei! Em todos os sentidos.
A música era alegre, mas os meus passos eram os de uma marcha antiga.
Daquelas cidadezinhas das fotografias do meu trabalho!

domingo, 19 de agosto de 2012

Eu queria ter escrito esse poema:

O QUE SE FOI

O que se foi se foi.
Se algo ainda perdura
é só a amarga marca
na paisagem escura.

Se o que foi regressa,
traz um erro fatal:
falta-lhe simplesmente
ser real.

Portanto, o que se foi,
se volta, é feito morte.

Então por que me faz
o coração bater tão forte?

Ferreira Gullar

Volto?


Volto porque preciso. Sentir é fundamental para poder reviver. Não sei seguir. Não sei manter-me ao lado. Só sei que eu sou muito do que não estou conseguindo ser. Volto porque não acredito mais.
E tentar é uma boa forma de fingir. Volto porque posso mudar quase tudo. E este quase apenas me atrapalha.
Mostro-me sem esperança de ser vista. E não me importa, nem um pouco.
Permaneço aonde eu estava nos últimos momentos. E agora com a aceitação que vem apenas com o tempo.
Volto em um momento delicado. No qual não sinto a distância, porque ela não pode existir. Volto porque tenho medo.
E não tenho conseguido dizê-lo ou demonstrá-lo.
Volto somente para que não deixe de existir.